Um Centro Cultural fincado em um Parque Ecológico composto por uma lagoa em meio a uma mata incrivelmente diversificada. Uma cidade onde se respira poesia, que é capital de um estado rodeado por montes, serras e cachoeiras. Uma história de luta ambiental, social e com uma construção cultural sólida, coesa, plural e viva, muito viva. Este foi o cenário para a criação da 1ª Semana da Poesia Popular da Lagoa do Nado.

A ousadia de uma turma produtora de arte, responsável pela Livraria Pé Vermelho,  transformou o Centro de Referência da Cultura Popular e Tradicional Lagoa do Nado, por uma semana, isso mesmo, sete dias, no núcleo poético do Brasil.

Mais de 150 personalidades desfilaram suas mentes brilhantes, suas línguas afiadas e suas falas líricas e literárias no Maior Parque Ecológico Cultural de Belo Horizonte, sendo que o local abriga há 22 anos o Sarau Poético da Lagoa do Nado.

O domingo, dia 05/03/2023, foi a data escolhida para o encerramento de uma semana mágica e histórica, que teve início na segunda anterior, quando o calendário ainda marcava dia 27/02/2023. Naquela oportunidade, ainda havia sol, ao fim da tarde o ambiente foi sendo tomado por poetas e amantes da poesia e da arte em geral, para darem as boas-vindas a Ailton Krenak e Ricardo Aleixo. Sob o tema “As cores da poesia e o segredo da palavra”, os dois mestres se achegaram trazendo na bagagem artística, filosófica, cultural, muita sensibilidade ancestral, fincada na temática negra e indígena, divagando entre a degradação ambiental, social e econômica, mas com a sabedoria advinda dos antepassados, despejando um mar de contemporaneidade, sapiência e muita poesia.

Após uma longa conversa interativa com os/as presentes, Ailton Krenak e Ricardo Aleixo demonstraram toda sua simpatia, paciência e carinho com o público, ao participarem da solenidade de abertura oficial da Semana Poética, com o acendimento da Pira Poética. Muito solícitos, os autores atenderam às pessoas presentes, tirando fotos e assinando livros e mais livros.

Uma abertura digna do tamanho do evento e dos dois mestres convidados.

Na sequência da semana, houve a divisão por temática, diariamente contemplando um movimento poético, sócio, cultural. Na terça, dia 28/02, a mesa foi formada pela comunidade LGBTQIAP+, abordando o tema “Cores, corpo, alma, (poesia LGBTQIAP+)”. A coordenação e curadoria foi de Ed Marte, Evandro Nunes e Renato Negrão e participação especial de Emy Roots, Eli Nunes, Jazz Orimauá, Júlia Elisa, Júlia Santos, LG da Lage, Nívea Sabino, Pieta Preta e Tka. Com cores, corpos e almas engajadas, conectadas e integradas ao ambiente, a mesa trouxe para o debate assuntos delicados e necessários como a discriminação, o preconceito, o desrespeito, a falta de oportunidades e o mais grave, a violência contra as pessoas homossexuais. Mas também houve o espaço para a poesia, a música, a boa prosa e é claro o enaltecer das qualidades, virtudes, forças, lutas e conquistas desse movimento que cada dia mais, mesmo com muita gente jogando contra, busca seu espaço e seu lugar de fala dentro da sociedade. Muita energia ancestral, vivências, desilusões, amores, desabores, alegria e harmonia marcaram o 1º Sarau LGBTQIAP+ da Lagoa do Nado, que emanou toda potência, fortaleza, valentia e vivacidade dos poetes e do público.

O terceiro dia foi a celebração da evolução poética através de um bate papo, retratando a poesia produzida em BH de 1922 até os anos 2000, incluindo aí os 22 anos de Sarau da Lagoa do Nado.

A mesa de conversa foi composta por Antonio Paiva Moura, Biláh Bernardes, Brenda Marques, Ênio Poeta, Fernando Fabrini, Isaías do Maranhão, Jimi Vieira, José Moreira de Souza, Leonardo Magalhaens, Moisés Augusto Gonçalves (Prof. Catatau), Rogério Salgado, Ronald Claver, Vera Casa Nova e Wagner Torres. Com esse time de peso e o reforço da plateia, delineou-se uma tarde-noite incrível de muitas nuances literárias e histórias incríveis de vida, arte e construção histórica em momentos únicos de poesia e música, retratando o tema: “As matizes na história da poesia de BH”.

Depois, foi a vez de a marginalidade poética tomar conta da Lagoa do Nado. Foi no dia 02 de março, quinta-feira, com o tema “A cor da margem”. Os/as poetas marginais espalharam anarquismo, contravenção, ideais revolucionários, destilando muita poesia marginal e outras tendências, nos quatro cantos do Parque Lagoa do Nado. Aroldo Pereira, Coletivoz, Digô Farias, Laércio Gomes, Marcos Assis, Marcos Fabrício, Paulo Balmant, Regina Melo, Ricardo Evangelista, Rogério Salgado, Vinícius Cardoso, Wal de Souza e Will D King, com poemas, contos, cordéis, cantos, canções, músicas, solfejos, performances e poesias de altíssima qualidade literária, promoveram uma verdadeira dinâmica poética revolucionária. Ficou difícil conter a emoção: lágrimas, abraços, sorrisos e muita energia positiva foram compartilhadas ao longo do encontro.

Sextou, galera! No dia 3 de março, adentrou ao Parque, como se estivesse pisando na Sapucaí, entoando o canto “ô abre alas que eu quero passar”, a roda de conversa intitulada “Poesia de Samba de Mesa”’. A ala sambista da poesia estava representada por Gibran Muller, Mestre Linguinha, Barrão, Dona Eliza, Fabinho do Terreiro, Gilmar do Cavaco, Mestre Ronaldo Coisa Nossa, Nonato e Pirulito da Vila. Se comparado a um Samba-Enredo, essa turma com certeza é nota 10, levantando a avenida e não deixando ninguém parado. Com muita ginga, malemolência e potência na garganta para puxar a escola, a conversa foi de malandro, como se diz no morro. Poesia entoada em ritmo de samba e samba com a lírica de poesia, cada tom de voz ecoado trazia contigo a força de uma história carregada de ancestralidade, tradição e amor ao samba, à música e à poesia.

De repente, surge o sábado e com ele a conversa que vai do Cordel ao Hip Hop, com muito improviso, mas sem abrir mão da qualidade sonora, vocálica, harmônica, musical e poética. O tema “De repente, Cordel ao Hip Hop” arrastou para o centro do debate um slam de peso. Doctor Bhu, Shabê, DJ Selecta Shom Uais, Ricardo Evangelista, Seu Ribeiro e Yendis Asor Siad, como em um desafio repentista, usaram todas as rimas e métricas do saber ancestral, contemporâneo, tradicional e de rua, para elucidarem assuntos sobre a formação, evolução e vivência dos vários estilos que compõem a construção do universo da palavra utilizado na rua, pelo povo e para o povo.

O domingo, o derradeiro dia do desfecho da obra. Para abrir o dia cheio de bênçãos e energias positivas, O Boi Rosado encaminhou o sagrado com o cortejo do Boi e percorreu uma área do parque, abençoando as/os presentes. A Ciranda do Boi encerrou o cortejo com a passagem do Boi para Eliane Potiguara, em uma celebração repleta de simbolismo, magia e divindade.

Com o chão benzido e o ambiente purificado, o espírito feminino pediu passagem para receberem as anfitriãs do dia. A mesa de debate sobre o tema “As poetas de (Cor)ação”, integrada por Eliane Potiguara, Avelin Kambiwá, Brenda Marques, Biláh Bernardes, Cida Araújo, Wal Souza e Yasmim Salim, sacudiu o universo feminino com uma efusão de argumentos diversos que demonstraram a complexidade coletiva de vivências experimentadas por mulheres de várias idades, etnias, crenças, mas que comungam de dores, amores, desabores, lutas e conquistas e principalmente confirmam a intensidade produtiva que existe dentro de cada uma delas e quão capazes são de superar obstáculos e atropelar as dificuldades, sem que isso abale a sensibilidade e a sensatez com que lidam com as alegrias e as adversidades.

Com um sarau totalmente composto por poetas femininas, a 1ª Semana da Poesia Popular da Lagoa do Nado encerrou o evento com energia vibrante e mensagem muito explícita. É necessário transformar o mundo em que vivemos e que não se pode mais suportar as várias formas de violências impostas às mulheres em âmbito geral, independente de sua cor, raça, etnia, crença, cultura, classe social e econômica ou qualquer fator delimitador.

Ricardo Evangelista e Marco Llobus, idealizadores do evento, em nome de toda equipe, agradeceram a participação, a presença, a ajuda e o compartilhamento de todos os momentos mágicos vivenciados durante a 1ª Semana da Poesia Popular da Lagoa do Nado. Eles deixaram em suas falas a esperança de que muitas outras semanas poéticas hão de vir, para o deleite dos amantes das artes.

Por Elmo Sebastião

Revisão de Marcos Fabrício Lopes Machado

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