
Querida leitora e leitor cinéfilos ,
A coluna Sala de Cinema sempre falou de filmes e do papel que eles exercem na vida social e cultural. A sétima arte é uma das principais janela para esse movimento, por ela conhecemos o mundo e a nós mesmos. Hoje, abro mão por um instante os filmes, para contar uma outra história onde mora as telas, as histórias dos próprios templos do cinema em Belo Horizonte, sou uma belorizontina apaixonada pela cidade e, trarei para vocês nessa matéria uma pesquisa que fiz e também minhas percepções pessoais e afetivas das salas de cinemas de rua que foram, por décadas, o coração cultural, entretenimento e social da cidade. Foram lugares de marcantes arquiteturas, cada fachada uma história de sua época, cada ingresso um convite nostálgico, cada descortinar e o apagar das luzes surgiam um sonho desejado vindo das telas.
Caminhar por essas memórias, é como assistir um filme de uma época dourada dos nossos cinemas de rua, é lembrar das catracas que faziam um barulho ritmado quando você passava, o tapete vermelho sob os pés, os pisos elegantemente carpetados, ver o feixe de luz cortando o escuro, vindo das lanternas vigilantes nas mãos dos lanterninhas , atentos sempre aos beijos e tentativas românticas ousados dos casais no apagar das luzes , ver o Seu Baleiro com um caixote de madeira pendurado em uma faixa grossa ao pescoço anunciando balas ,chocolates e afins. Era um rito, a rua movimentada e as calçadas efervescentes de gente às portas destes cinemas, verdadeiros futes sociais ponto de encontro da sociedade mineira, pessoas que se vestiam elegantemente para este grande momento, depois com o passar do tempo deram lugares aos points de encontros de casais de enamorados , famílias curtindo férias escolares com as crianças, Enfim era as ruas cedendo seus ruídos para o silêncio majestoso das salas de cinemas, que eram interrompido por risadas coletivas, suspiros , gritos de suspense e lágrimas, era o encantamento que os filmes provocavam nas pessoas como um encanto mágico.
Nesta edição da coluna Sala de Cinema começo uma viagem mágica por este cenário os “Cinemas de ruas de Belo Horizonte”, que encantou e foi referência cultural de gerações durante décadas e décadas, nos transportava para a projeção dos sonhos.
Nossa história será dividida em duas partes, e convido vocês a mergulharem comigo nessa imersão maravilhosa, repleta de luzes, telas e memórias inesquecíveis. Preparem-se para redescobrir o charme, a magia dos cinemas que marcaram a vida de nossa cidade.
Abaixo, convido vocês a pegar o ticket, atravessar a catraca, entrar no escurinho do cinema e ao abrir as cortinas sentir o contexto social e histórico vindo da tela da memória, que cada cinema marcou em Belo Horizonte.
Cine Theatro Brasil — Praças, Terraços e Luxo Art Déco

Inaugurado em 14 de julho de 1932, o Cine Theatro Brasil (hoje Cine Brasil Vallourec) era um monumento Art Déco plantado em frente à Praça Sete. Um edifício alto, revestido de detalhes, vitrais que filtravam a luz e um terraço de onde a cidade parecia ainda menor. o Cine Theatro Brasil se impôs como um dos maiores cinemas de rua do país, erguido em um prédio de 11 andares em frente a praça sete onde se localiza o icônico projeto arquitetônico símbolo do centro da cidade agora palco de movimentos sociais trabalhista e políticos da capital belo horizontina, à moda Art Déco, concreto armado, vitrais que filtravam a luz do centro e uma vista panorâmica do terraço, onde BH parecia mais bela no auge em sua época dourada.
As bilheterias eram janelas envidraçadas, com moedinhas e talões; o ticket era impresso com número, às vezes perfurado à mão na entrada. Logo após as catracas metálicas, com a sensação táctil dos sons que fazia ao passarmos por elas, abria-se um grande salão vermelho: carpetes extensos. poltronas de couro macias, frisas, escadas de mármore e o painel marajoara de Ângelo Biggi que dava ao ambiente um tom quase sacro.
Fotógrafos uma constelação de “paparazzi” amadores esperavam na saída: flash, clique, bilhetinho com a data e a loja onde a foto seria revelada. Era comum voltar dias depois à sobreloja do centro para buscar o retrato daquela noite. O Cine Theatro Brasil arquivou bailes, peças, estreias e revoluções de estilo. Desativado em 1999 , Cine Brasil durante muitos anos foi o cinema mais popular de Belo Horizonte e era frequentado por todas as classes sociais da cidade . Foi salvo da demolição e restaurado com investimentos da Vallourec e Lei Rouanet. Reabriu em 2013, como Cine Brasil Vallourec, agora palco de teatro, dança, shows e mostras ,resistente e belo no Coração da capital
Cine Pathé — Aconchego e Arte

O Pathé nasceu em 1948, na região que hoje chamamos Savassi. Com mil lugares e um perfil de cinema de arte, tinha um hall de entrada elegante, poltronas bem estofadas e uma programação que atraía os cinéfilos mais exigentes. As catracas, menores que as do Brasil, mantinham ordem e ritual; os tickets vinham em talões e passavam por mãos ansiosas. Lanterninhas, jovens em uniforme, com lanternas que piscavam entre as filas, guiavam os espectadores até seus lugares. Do lado de fora, os ambulantes vendiam balas em caixotes, bilhetes de loteria e conversas de bairro. O Pathé fechou suas sessões regulares nas décadas finais do século 20, vários outros estabelecimentos tentaram se firmar no local, incluindo templos religiosos, mas nenhum durou o suficiente, então restaram fachada e um hall tombados por quem quis preservar aquelas linhas de memória.
Cine Palladium — O Luxo da efervescência contracultural dos Anos 60

Inaugurado nos anos 1960, muito lembrado por sua grandiosidade. A partir de 1963, o Palladium era o símbolo do luxo moderno: 1.100 lugares, tapete vermelho, letreiro iluminado, cortinas pesadíssimas que se abriam solenemente. O grande salão oferecia som caprichado e sensação de evento. As bilheterias imprimiam ingressos com relevo nas estreias, e havia sempre fotógrafo à saída, como se estrelas anônimas circulassem pelo lado de cá da tela. O Palladium encerrou suas atividades ao final do século passado; por um tempo foi alvo de projetos culturais que buscavam dar nova função ao espaço.
Cine Acaiaca — O Arranha-céu cultural

O Cine Acaiaca ficava ligado ao imponente Edifício Acaiaca, um suntuoso edifício grande, de muitas histórias. O cinema foi, por décadas, ponto de encontro no coração do centro de Belo Horizonte, com bilheteria em balcão clássico, catracas de ferro e bilhetes que marcavam assentos no salão. O Acaiaca era um exemplo de como a arquitetura de usos mistos , com lojas no térreo e sobre lojas e salas de exibição era o motor comercial , empresarial e cultural da cidade: era cinema, era convívio. Muitos desses empreendimentos mudaram de uso com o tempo igrejas, menos lojas, algumas salas fecharam , mas o traço arquitetônico continua imponente no prédio do edifício Acaiaca , a esfinge de um rosto indígena está ali imponente como sua marca registrada.
Cine Jacques – O cinema campeão de bilheterias, das filas de dobrar quarteirões

O Cine Jacques, localizado na Rua Tupis, 317, uma das artérias do Centro de Belo Horizonte, foi inaugurado em 1958. Segundo relatos de frequentadores da época, o cinema foi construído por Jacques Luciano Pereira, que também era proprietário do estabelecimento.
O Cine Jacques era um dos cinemas de rua mais tradicionais da cidade, com capacidade para 1.800 espectadores. Foi demolido para dar lugar ao Shopping Cidade, inaugurado em 1995. O fechamento do Cine Jacques marcou o fim de uma era para os cinemas de rua em Belo Horizonte, encerrou suas atividades no início dos anos 2000 , o Jacques era sinônimo de sessões lotadas: falamos de um cinema grande, com cerca de 1.800 lugares, e uma fachada que se transformava em letreiro luminoso nas noites de estreia.
As catracas trabalhavam em ritmo de relógio . Atrás das catracas, o saguão fervilhava de jovens, ali sempre estreavam os filmes de bilheteria mundial, portanto a característica de público era em sua maioria de jovens. Bombonieres pequenas vendendo guloseimas; lanterninhas afáveis guiando idosos e namorados. o cinema foi um importante ponto de encontro cultural durante várias décadas.
O legado do Cine Jacques permanece na memória afetiva dos belo-horizontinos que frequentaram suas sessões ao longo dos anos. A história desse cinema é um reflexo da evolução cultural e urbana de Belo Horizonte, marcada pela transformação de espaços tradicionais em novos centros de convivência e lazer.
O Jacques foi, como tantos outros, substituído por edificações , o centro foi se reconfigurando, mas a lembrança da fila e do letreiro permanece gravada.
Cine Candelária — Ruína e Saudade

O Cine Candelária, um dos cinemas de rua mais emblemáticos de Belo Horizonte, estava localizado na Praça Raul Soares, nº 315, no Centro da cidade. Inaugurado em 11 de dezembro de 1952, o Cine Candelária destacou-se por sua arquitetura art déco, assinada pelo arquiteto Nicola Santolia, e por ser um dos maiores e mais confortáveis cinemas da cidade na época. O Candelária era um grande cinema cerca de 2.000 lugares que levou à cidade filmes de perfis variados, inclusive europeus. O foyer amplo, anunciava suas sessões com cartazes emoldurados e bilheteria de vidro, o salão era imponente, com fileiras que pareciam do teatro municipal do Rio de Janeiro.
Após décadas de funcionamento, o Cine Candelária passou a exibir filmes de conteúdo adulto a partir de 1983. Com mudanças urbanas e perfil das exibições, o Candelária acabou decadente no fim do milênio; um incêndio e abandono deixaram sua fachada em ruínas. Em 1995, as projeções foram encerradas, e o prédio ficou desocupado por vários anos. Em 2004, um incêndio atingiu o imóvel, causando danos significativos e levando à necessidade de demolição de partes da estrutura para garantir a segurança da população.
Atualmente, o local onde funcionava o Cine Candelária é utilizado como estacionamento. Apesar de ser tombado como patrimônio histórico, o edifício permanece desativado e sem uma destinação definitiva. Projetos de revitalização foram discutidos ao longo dos anos, mas até o momento não houve implementação significativa, neste impasse resta um monumento melancólico ao que eras os cinemas de rua.
Cine Santa Tereza — O Abraço do Bairro

O Cine Santa Tereza está localizado na Rua Estrela do Sul, nº 89, no bairro Santa Tereza, região leste de Belo Horizonte. Este bairro, conhecido por sua efervescência cultural, foi o berço de ícones da música brasileira como Milton Nascimento e o Clube da Esquina. O Santa Tereza abriu suas portas em 20 de maio de 1944, seu traço art déco era evidente, fachada trabalhada, hall acolhedor e um salão onde o público do bairro fazia seus encontros comunitários.
As bilheterias eram janelas com divisórias, havia sempre o vendedor de bala com seu caixote na calçada , sacudindo caixinhas de balas em uns deliciosos e saudoso barulhinho em estalos , havia uma pequena bomboniere no espaçoso salão de entrada.
O Cine Santa Tereza foi um dos principais cinemas de rua da cidade, oferecendo entretenimento e cultura para diversas gerações. Com o tempo, enfrentou desafios, como a concorrência com os shoppings centers, que levaram ao seu fechamento no final dos anos 1980. O cinema fechou nas décadas difíceis para o cinema mundial, com a popularização das locadoras de vídeo nos anos 90. Foi usado em outros fins, boate, espaço de shows, e voltou à vida quando a comunidade do bairro se uniu e lutou para restaurá-lo, então o Cine Santa Tereza foi revitalizado e reinaugurado como equipamento cultural público em 26 de abril de 2016, vinculado à Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte. Essa reabertura marcou o retorno do cinema à vida cultural da cidade, oferecendo uma programação diversificada e acessível reabrindo como espaço cultural público no O Santa Tereza é a prova de que paixão e resistência podem reencenar um lugar.
Atualmente, o Cine Santa Tereza oferece uma programação gratuita de terça a sexta-feira, das 10h às 21h, e aos sábados, domingos e feriados, das 16h às 21h. As sessões incluem filmes nacionais e internacionais, lançamentos de produções locais e regionais, além de exposições e ações educativas.
Convido a todos os leitores Belo Horizontinos e mineiros de outras cidades a visitarem o Cine Santa Tereza, é história viva , nostalgia pura dos cinemas de rua em um espaço de imersão que preserva a memória cinematográfica da cidade. Acesso Gratuito, uma programação cultural de qualidade sem custos , em ambiente aconchegante.
O Cine Santa Tereza é mais do que um cinema; é um ponto de encontro dos Belo Horizontinos com sua história e cultura, um espaço de resistência e nostalgia de uma época dourada da cidade e um testemunho da rica história cinematográfica de Belo Horizonte. Se você cinéfilo busca uma experiência cinematográfica autêntica e acessível, este é o lugar .

Queridos cinéfilos, conforme anunciei no início desta coluna, nosso passeio pelo cinema de Belo Horizonte será dividido em duas partes. Nesta primeira parte, mergulhamos na memória e nas histórias de seis cinemas inesquecíveis: o Cine Arte Brasil, o Palladium, o Acaiaca, o Jaques e o Santa Tereza e o Cine Paté. Cada um deles, com suas luzes, roletas, baleiros e lanterninhas, marcou gerações e deixou um legado afetivo que ainda trazemos em nossas lembranças.
Na próxima coluna, trarei a segunda parte dessa jornada cinematográfica, explorando o charme e a história de outros clássicos da cidade: o Cine México, o Cine Metrópole, o Cine Rocks, o Cine Royal, o Cine Independência e Cine Odeon, além de curiosidades sobre o cinema de rua. Também trarei da minha memória afetiva um trecho que reservarei para apresentar a vocês minhas experiencia outrora de infância que guardo com tanto carinho e saudade de um tempo mágico e feliz vividos na sala de cinema que havia no bairro em que morei e cresci, na região industrial de Belo Horizonte.
Mas será um novo papo, uma nova história a ser contada, que espero compartilhar com vocês no nosso próximo encontro aqui, na coluna Sala de Cinema, no portal Libertas News. Aguardo todos vocês para mais uma sessão imperdível, repleta de memórias, nostalgias e da mágica que só a sétima arte é capaz de nos proporcionar.
Até lá, deixo o convite para essa imersão, é só fecharem os olhos, sintam o cheiro da pipoca, o tilintar das catracas, o escurinho das salas e os sons e imagens das primeiras cenas projetadas na tela… e preparem-se para embarcar novamente nesse universo encantador que é o cinema de rua de Belo Horizonte.
Por : Andréia de Oliveira – Colunista – Sala de Cinema
Arte na vida sempre, até o nosso próximo encontro!
Leia esta e outras matérias da colunista no Portal Libertas News.
Ouça o Programa Sala de Cinema, apresentado por Andréia de Oliveira e Silvânia de Oliveira- Na Rádio Libertas, terças, quintas e sábados de 18:horas às 19:30.
Fonte de pesquisa: http://acervo.pbh.gov.br/
http://www.otempo.com.br/
Nossa quanta saudade desses cinemas de rua. Essa matéria é pura nostalgia. Nessa época ir ao cinema era um evento. Tempos bons! 😊
É isso aí Ana Paula , saudades deste tempo bom , quando aguardávamos ansiosas uma estreia na telona !
Obrigada Ana Paula pelo comentário.
Olá aqui é Lucrecia Fonseca Atriz…achei espetacular esse tema aí…mostrando os cones de BHte…baixou a nostalgia onde assisti vários campeões de bilheteria Parabéns!!!Andreia de Oliveira!!!Amei….sou apaixonada pela sétima Arte….bjs!!!!
Olá Lucrécia , é um prazer saber que uma atriz leu a minha matéria, muito obrigada pelo seu comentário , os cinemas de rua deixaram nostalgia na gente .
Que texto! Que materia! Um pouco de arte com direito aa boas memorias.
Parabéns Andreia!!!
Excelente matéria!
Nostalgia pura !!!
Que saudade das antigas Salas de cinema!
Viajei no tempo!
Newton , obrigada pela mensagem , fico feliz que gostou!!!
Interessante conhecer essa parte da história sobre essa perspectiva.